terça-feira, 29 de outubro de 2013

Campeonato de Futebol Amador de Petrolina: Um baú de memórias

Eram quase sete horas da noite, numa segunda-feira. Aguardávamos nosso entrevistado do lado de fora da sua oficina de refrigeração, em Petrolina. O ex-jogador Louveci Rodrigues dos clubes Petrolina e 1° de Maio terminava mais um dia de trabalho. Depois de apagar as luzes, fechar os portões do seu local de trabalho, Louveci demonstrando cansaço, mas não perdendo a simpatia, nos convidou até sua casa para relembrar seus dias de glória nos gramados do futebol amador e profissional.

Se há uma família que possui histórias sobre o futebol na cidade, sem dúvida alguma é a de Louveci. De 14 filhos, Vé - como era carinhosamente chamado dentro de campo- é o 10º filho, dentre 11 homens, todos jogadores.

Louveci atuou na equipe do América nos anos 1970 (Foto: Arquivo Pessoal)
Assim como Louveci, outros 9 irmãos passaram por times amadores e profissional em Petrolina. Sua família sempre fez parte de equipes de futebol no bairro. Começou no Ferroviário que era o time de sua família, e depois atuou no Caiano, Palmeiras e América que eram os maiores times da cidade na época.

“Eles contratavam os jogadores que se destacavam nos times menores e botavam nas equipes com maior força. Na minha época, quando fui pro América, do meu time fomos eu e mais três jogar lá” relembra.

O fato dos homens da família atuarem no futebol amador resultou num apelido carinhoso para os Rodrigues. Em um dia de jogo entre amigos, Louveci e os 10 irmãos iam juntos para o local de um jogo que os marcaria para sempre.

“Nós temos uma família de 14 irmãos, com 11 homens. Ai tinha os campeonatos em bairros. A gente ia pro Quati, pra Cohab todo mundo junto. Um ficava na casa de um e outro, só andava junto. Num dia alguém falou ‘olha parece um monte de gato, tudo junto’. Esse apelido pegou e só passara a chamar a gente de ‘os gatinhos’".

Lateral polivalente, Louveci jogava em duas posições, mas nos times grandes não teve muita oportunidade e sempre ficava no banco, até a chegada do 1º de Maio, onde foi campeão do primeiro, segundo e terceiro turno.

O período de Louveci na reserva teve fim quando o jogador foi para o 1º de Maio, onde foi campeão absoluto das três fases do campeonato amador.

Campeão absoluto no centenário 

No 1º de Maio Louveci viveu os melhores anos de sua carreira. O ano era 1975, data que marcava o centenário de Petrolina. O modesto time azul e branco se organizava para participar do campeonato amador.

Louveci e as lembranças do período em que era lateral (Foto: Giomara Damasceno)
Ao início da competição, todos apontavam os favoritos Caiano, Palmeiras e Amércia como favoritos, eis que o 1º venceu todas as três fases daquela edição do campeonato. Apresentando um futebol de saltar aos olhos da torcida, o time de seu Louveci jogou de igual pra igual e conquistou o torneio do centenário.

O bom futebol do 1º de Maio naquele ano rendeu jogos com os grandes times de Pernambuco, como o Naútico, Santa Cruz e Sport. Mas Louveci relembra que na sua época de jogador, todo mundo ia pra campo pelo amor ao esporte e não por dinheiro. Os jogadores trabalhavam durante a semana e jogavam aos finais de semana. Havia ocasiões em que os jogos eram fora da cidade e a equipe tinha que viajar.

“A gente jogava no domingo, viajava na sexta de madrugada, passava o sábado descansando. Jogava domingo de manhã cedo ou de tarde. Terminava o jogo só fazia tomar banho, jantar e vinha de lá pra cá. Chegávamos segunda de manhã. Não aguentávamos nem trabalhar. Foi muito sacrifício. Mas, foi gostoso” comenta Louveci.

O ex-lateral atuou por alguns anos no futebol profissional, vestindo as cores do 1º de Maio. Segundo ele, o que atrapalha os clubes da cidade são as pessoas por trás da direção.

“Não tínhamos muito apoio. Os empresários ficavam com receio de investir. Estávamos começando como profissional. Não sabiam se íamos dar certo. Hoje, eles não pagam salários, atrasam cinco, seis meses e nenhum jogador quer ficar sem receber” diz.

Entre as várias lembranças do período em que jogava, Louveci destaca as “aventuras” vividas na estrada. “Teve uma vez que na volta o ônibus quebrou na estrada. Perto de Arco Verde, no meio da noite. Era meia noite ou uma hora da manhã. Aí a gente ficou no meio da estrada. Dormimos no posto. No posto passa muito caminhão. Pegamos um caminhão. Em cima da carga. Só que o caminhão não vinha direto pra Petrolina. Ia descarregar em Santa Maria. Um menino tinha uns trocados, daí pegamos um carro de linha” conta em meio a risadas.

Ainda hoje Louveci joga futebol, mas só entre amigos. A maior parte do seu tempo é voltada para o trabalho de técnico em refrigeração e à família. Avô de um menino de quase um ano, Vé espera poder compartilhar suas histórias com as próximas gerações.

Época áurea do futebol amador 

Outro jogador do futebol amador em Petrolina é Francisco Héldder Viana que jogou há 10 anos. Ele passou pelo time do Petrolina e pelo 1º de Maio e há 15 anos está envolvido diretamente com o futebol amador da cidade.

Atualmente, Héldder é presidente da Liga Desportiva Petrolinense (LDP) – órgão responsável por organizar as competições amadoras na cidade.

“No tempo que eu joguei, a gente via que o estádio estava sempre lotado. As torcidas de todos os times vinham [assistir ao jogo]. Eram do Caiano, América, Palmeiras e de todas as equipes” relembra Héldder.

Fora dos gramados, Hélder não abandonou o futebol (Agência CH)
O período em que Hélder atuou foi o auge de grandes jogadores, os quais inclusive jogaram em times de maior expressão nacional.

“Era um campeonato para revelar jogadores. Na minha época, que foi uma geração muito boa, surgiram grandes nomes que chegaram a jogar no profissional em times da capital” relembra.

Entre as grandes revelações do futebol amador da cidade está Juninho Petrolina. O atacante que teve o auge da sua carreira na década de 90, quando revelado pelo time do 1º de Maio, foi jogar em times como Atlético Mineiro, Sport, Vasco da Gama e Vitória de Salvador. Juninho atuou ainda em clubes de Portugal, como Belenenses, Beira Mar e Penafiel.

Outros nomes citados por Héldder são Ailton que jogou no Atlético Mineiro, Europeu, Ovoredo e Genilson.
Torcida: gerações distintas 

No começo dos anos 2000, o campeonato amador passou por mudanças com a profissionalização do futebol. Na opinião de Héldder a chegada do futebol profissional à região e desorganizou o amador. “O futebol profissional chegou de uma forma tardia e ainda desorganizou o amador, tanto aqui como em Juazeiro [da Bahia, cidade vizinha a Petrolina]. Somente agora que estamos conseguindo dar uma nova cara no futebol amador, para que a gente também possa revelar jogadores para o time profissional da cidade.”

A profissionalização de 1º de Maio e do Petrolina afetou o futebol amador de tal forma que entre 2005 e 2010, o campeonato amador organizado pela LDP ficou interrompido, sendo retomado apenas em 2011. Nesses cinco anos, o futebol profissional cresceu em incentivo da mídia local e de patrocinadores, deixando o amador na reserva.

Com a retomada do campeonato amador, a Liga Desportiva Petrolinense mantém os 9 clubes filiados desde sua criação: Caiano, Palmeiras, Flamengo, Ferroviária, 1º de Maio, Petrolina, América, Santa Cruz e Náutico.

Mas com a profissionalização do futebol, dois times despontaram. Até hoje a rivalidade entre o Petrolina e o 1º de Maio é grande. Segundo Héldder, um torcedor do 1º de Maio, no inicio de uma partida entre o Azulino e a Fera Sertaneja invadiu o campo e começou a abraçar o time. O torcedor apaixonado quase foi preso.

Tal fato ocorreu pela torcida do 1º de Maio ser “mais fiel e apaixonada, além de ser em maior número naquela época.”.

Tanto Louveci Rodrigues e Francisco Héldder tem um desejo em comum. Que o futebol amador não caia no esquecimento. “Isso faz parte da história. Os jogadores de hoje estão ai, viajando em ônibus com ar condicionado, enquanto a gente viajava naqueles sem condição. As pessoas não podem se esquecer do que fizemos” desabafa Louveci.


Por: Alieny Silva, Giomara Damasceno, Maria Akemi Yamakawa

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